É real! Quando você viaja a um destino pouco frequentado e pobre em recursos (todos, desde infra estrutura básica até econômico mesmo), você sofre uma transformação e um bak psicológico e até espiritual, que pode tornar sua visão do mundo e do ser humano algo totalmente novo para você.
Por isso eu recomendo este tipo de experiência para aquelas pessoas que tem depressão (que nem sabe bem saída de onde), são muito materialistas ou estão a procura de um sentido para a vida e se sentem meio vazias.
Meu pai dizia que não existia remédio melhor para a depressão do que uma enxada.
Eu acho que não deixa de ser verdade, uma vez que o que talvez esteja faltando é um choque de realidade, como quando você se vê diante de uma situação muito pior do que a vivida no seu dia a dia. Ou quando você vê que migalhas de pão podem ter mais importância para alguns do que aquela comida quentinha que você recusou tantas vezes por achar que não ia gostar ou não era aquela sua preferência.
Se você acha que o que estou dizendo é estupidez e jamais iria a um lugar assim, você é o candidato ideal a fazer uma viagem dessas, e garanto que você já demorou para ir! Mecha essa bunda flácida.
Eu também não me dava conta desses detalhes da vida que acontecem em alguns grotões que parecem tão isolados, longe de nossos olhos, principalmente alguém que vive aqui em Florianópolis, em um bairro nobre, e cercado de regalias.
Mas a vida, quando é bondosa conosco, nos propicia esse choque de realidade (graças a Deus), e então nos vemos diante daquela situação transformadora.
A minha se deu em 29 de Abril 1996, na fronteira de terra entre o Peru e o Equador, na cidade de Huaquillas. A fronteira física não passava de um leito seco de rio, que servia como depósito de lixo e onde porcos, galinhas, cachorros e crianças vestindo trapos ( quando não estavam nuas) e imundas, brincavam e se alimentavam naquele monte de sujeira. Eu passava lentamente por aquela paisagem seca e deplorável, enquanto o táxi tentava inutilmente desviar de inúmeros buracos naquela rua empoeirada e fétida que levava ao posto de fiscalização onde iríamos carimbar os passaportes. A situação era tão nauseabunda que tive uma mistura de vontade de vomitar e de chorar, mas me contive pra não parecer fraco diante dos outros ocupantes do táxi.
Mais adiante na região sul do Equador, enquanto seguíamos viagem até Guaiquil, tive outras experiências semelhantes, e posso dizer que cheguei a ficar traumatizado a ponto de ter flach backs durante a noite.
Mas a partir de então, passei a saborear aqueles sanduiches prensados de queijo de cabra com alguns pelos, vendidos na beira da estrada, de forma mais prazerosa.
Outras experiências semelhantes foram surgindo ao longo do tempo, a medida que viajava para outros locais como Marrocos, África do Sul, Indonésia, Baja Califórnia (no México) e até aqui pertinho, no nordeste do Brasil. E parece que a pobreza extrema está sempre ligada a falta de água e ao isolamento econômico e social.
Por isso sempre recomendo aos amigos que vão viajar para lugares assim, não esquecerem de levar algumas roupas e calçados que não usam mais, e que certamente farão a diferença para pessoas que parece terem sido esquecidas por Deus. Você será como a mão de Deus diminuindo a pena e sofrimento deles, e ao mesmo servirá para estreitar elos de amizade e ternura que nunca se romperão. E por mais tempo que você leve para voltar lá, tenha certeza que você não será esquecido. E deixará neles sempre um resquício de esperança de que outro como você um dia aparecerá, ou que as coisas um dia melhorarão.
Espero ter ajudado a fazer você caro leitor perceber que viagem as vezes não é só pura diversão, e que, dependendo do destino escolhido, você terá uma dose extra de comprometimento moral, econômico e social, com a comunidade em que você estará inserido. Aproveite a oportunidade para promover essa modificação em sua percepção das coisas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário